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Estudo relaciona doenças em guardas de endemias a agrotóxicos

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Tremor é o distúrbio do movimento mais frequente na população e pode estar associado à exposição a agrotóxicos. Doenças hematológicas, dermatológicas, pulmonares, neurológicas, câncer, malformações congênitas, entre outras, também podem estar associadas a essa exposição. O Brasil, como o maior consumidor de agrotóxicos do mundo desde 2008, em grande parte à custa da indústria agrícola, movimentou, entre 2010 e 2011, a receita de US$ 8,5 bilhões e o consumo de 936 mil toneladas, o que representou 19% do mercado global de agrotóxicos nesse período. Os principais grupos profissionais expostos aos agrotóxicos são os trabalhadores do setor agropecuário, saúde pública, firmas desinsetizadoras, transporte e comércio, indústrias de formulação e síntese e área veterinária. É o que revela o artigo dos pesquisadores Marlos Fábio Alves de Azevedo, da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz); e Armando Meyer, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O objetivo do estudo foi avaliar a chance de tremor essencial em 442 guardas de endemias do Estado do Rio de Janeiro expostos a agrotóxicos. Foram selecionados 51 casos e 204 controles, com idade média de 49 anos. Os resultados indicam que aqueles com 16 a 16,9 anos de aplicação de agrotóxicos foram os que estiveram sob maior chance de apresentar a doença.

De acordo com o artigo, o tremor acomete mãos e antebraços, mas pode se manifestar em outras partes do corpo. “Clinicamente, o tremor essencial tende a ter uma evolução lenta durante os anos, e algumas comorbidades podem estar associadas. Dentre elas, têm sido descritas alterações cognitivas, transtornos de humor e da marcha. Alguns estudos observaram que indivíduos com tremor essencial têm quatro vezes mais chance de desenvolver parkinsonismo. São doenças distintas com mecanismos e patologias diferenciadas; entretanto, é frequente haver sobreposição dessas doenças, o que torna o seu diagnóstico e tratamento desafiadores.”

Os autores do artigo dizem que são poucos os estudos que avaliaram a relação entre tremor e exposição a agrotóxicos. O estudo sobre a saúde dos agricultores norte-americanos, realizado nos estados de Iowa e Carolina do Norte, entre 1993 a 1997, ainda é a principal referência no que se refere a essa relação. Baseado em questionários autoaplicados, estimou uma prevalência de tremor em 5% daqueles trabalhadores. O estudo realizado em agricultores canadenses também observou uma chance elevada de tremor naquela população. Apesar do possível equívoco devido à coexposição a metais (chumbo e mercúrio), aqueles agricultores apresentaram maior chance de desenvolver tremor quando comparado a dois grupos controles. 

Por outro lado, informam os pesquisadores, o estudo realizado em controladores de pragas e vetores de empresas privadas do Estado da Carolina do Norte não observou associação significativa. Apesar do referido estudo também ter utilizado dois controles distintos, a presença de trabalhadores jovens e com pouco tempo de aplicação de agrotóxicos pode ter influenciado na ausência de associação significativa. Da mesma forma, em outro estudo, realizado entre agricultores sul-africanos, também não foi observada associação entre tremor e exposição a agrotóxicos. Nesse estudo, apesar de utilizarem dois indicadores distintos para estimar a exposição acumulada a agrotóxicos, a pouca idade dos agricultores envolvidos e o baixo tempo de aplicação podem ter contribuído para a ausência de associação. Por fim, a exposição a agrotóxicos organoclorados também não esteve associada ao aumento de chance de tremor essencial em estudo caso-controle realizado em Manhattan, cidade de Nova York (EUA).

Segundo o estudo brasileiro, em média, a idade dos trabalhadores portadores de tremor essencial foi de 51 anos e está abaixo da média da maioria dos estudos que avaliam essa doença. “A precocidade da doença é um aspecto frequentemente encontrado em doenças ocupacionais.” Conforme informam os pesquisadores, os trabalhadores estudados eram bastante experientes e, em sua grande maioria, já haviam passado por inúmeras campanhas e múltiplas exposições químicas. No momento da confirmação diagnóstica, a maioria dos casos de tremor essencial era leve a moderado, com o tempo médio de início da doença de 5,3 anos, e poucos trabalhadores tinham a indicação de tratamento medicamentoso.

Já os casos de alcoolismo, que têm conhecido efeito deletério sobre o sistema nervoso central e periférico, foram excluídos da amostra. “Semelhante a outros resultados na literatura, observamos que o etilismo estava associado ao tremor essencial. A literatura ainda discute o real papel do etilismo social para essa doença, haja vista que clinicamente pequenas doses de álcool podem minimizar o tremor e, nos primórdios dos critérios de classificação, era considerado um sinal clínico para o seu diagnóstico.”

Foi observado também na pesquisa um potencial efeito protetor do tabagismo nos trabalhadores portadores de tremor essencial. “Esse efeito protetor é corroborado pela literatura vigente. Em modelo experimental de parkinsonismo em ratos, a nicotina apresentou-se como protetor neuronal por meio da indução de fatores neurotróficos”, explica o artigo.

O artigo Tremor essencial em guardas de endemias expostos a agrotóxicos: estudo caso-controle foi publicado na revista Cadernos de Saúde Pública, em agosto de 2017.

Fonte:Informe ENSP

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